Multiplicam-se nas redes sociais os “rolezinhos” de jovens das periferias para transformar corredores e estacionamentos de shopping centers em bailes funk improvisados.
Os “rolezinhos” são chamados de “invasões” ou “arrastões” pela mídia corporativa.
“Invasão”, no vocabulário da mídia, ocorre sempre que um ou mais pobres e negros se deslocam para um lugar onde “não deveriam estar”, pois numa sociedade segregada há lugares definidos para os diferentes segmentos sociais e raciais.
Já “arrastão” ocorre quando são centenas ou milhares de pobres e negros reunidos onde “não deveriam estar”. Pode ser um shopping ou uma praia de bacana.
Originalmente, “arrastão” era um tipo de crime violento. A estratégia da mídia é a de fazer confundir com assaltos em série a simples reunião de jovens da periferia que, com a criminalização dos bailes funk, decidiu se encontrar nos shoppings e improvisar seus eventos convocados pelo facebook.
Se a rua esta sendo vedada a eles, nada mais natural que achar um novo espaço.
Se quem pede que a rua seja vedada a eles frequenta o shopping, nada mais natural que este novo espaço seja o shopping, onde vão incomodar uma parte dos que devem ser incomodados.
Com essa atitude de jovens badernistas, o apartheid brasileiro se torna mais visível. Os shoppings daqui já não estão longe de usar aquelas placas “Whites Only” do Sul dos EUA e isso vai ser ainda mais descarado se essa onda de “rolezinhos” ocorrer. Ao mesmo tempo, a violência policial vai se estender para o interior e entorno dos shoppings, como já ocorreu em Vitória e em Itaquera (São Paulo).
Ou seja, uma derrota, ainda que pequena, da tradição de segregação velada, que esconde e dissimula o confronto, jogando a violência pra periferia.
Só dá pra combater o que é visível.
Que se jogue o apartheid na cara de todos.
Que o confronto seja aberto.
A onda, ao que parece, virá. Se a repressão comer solta como (sempre) promete, é possível que se faça jus ao rótulo de “arrastão” que a mídia quer colar nesses eventos. Dispersar violentamente uma multidão em meio a um templo do consumo teria provavelmente este efeito, afinal trata-se de uma multidão de pessoas formadas como consumidoras sem que tivessem dinheiro para se realizarem como tais.
Neste caso, que ao menos se possa dizer que o fim de ano foi melhor pra muita gente.